Hoje muitas
famílias estarão reunidas em torno de mesas alegres, celebrando seus pais.
Filhos estarão refletindo como são parecidos com seus “coroas”, jovens pais vão
curtir seus filhotes, fazendo projeções de como serão quando crescer, outros
vão acariciar barrigas, sonhando com o momento em que poderão ter nos braços seus bebes. Haverá famílias que não
terão o que comemorar: ou não têm pais que valham a pena, ou têm filhos
causadores de muita dor. Em alguns lares as “pães” serão o centro das atenções.
Elas receberão o carinho por terem sido pai e mãe. Há aquelas mães que vão internamente
reivindicar o dia como seu, e que
ilustram a frase do Facebook que diz: “Hoje é o dia do: pede pra sua mãe”.
Muitos vão
celebrar o dia, mas seus corações estarão apertados, pois tiveram ótimos pais
que foram embora muito cedo. É o meu caso. Quando meu pai se foi eu tinha nove
anos. Lamentavelmente o vi partir. Presenciei seu último suspiro. Eita ausência que dói! Você passa anos se perguntando: por que Deus fez isso? Por
que me castigou?
Evoca seu
pai tantas vezes, pede ajuda para suas dúvidas pueris, outras vezes fica diante
de enrascadas e pede, pede por um sinal. Mas o sinal não vem. Ou talvez você
não seja exatamente boa em decifrar sinais. Ou pior: talvez você não tenha fé
suficiente para receber a resposta. Ou quem sabe: tem fé demais e acaba refém da
sua crença.
E quantas
vezes você imagina: que tipo de vida teria tido caso seu pai tivesse ficado
mais tempo? Teria feito outro curso? Teria trabalhado em outras áreas? Teria casado
melhor ou pior? Teria tido embates, seria cordata? Enfim, quem perde um pai nunca
abandona a fase dos por quês?
O pai que
vive na minha imaginação é perfeito. Ele seria o porto seguro ao qual recorreria
quando a mente nublasse sem encontrar soluções. Seria o avô coruja, mas também
o que indicaria caminhos. Seria o portador frequente de boas novas. Na verdade,
meu pai era leve, alegre, brincalhão.
Pouco tempo
antes de morrer, ele me proporcionou um dia inesquecível. Levou-me ao Centro
Administrativo, local que concentrava as inúmeras repartições públicas de seu
tempo. Apresentou-me aos seus amigos, sempre estufando o peito de orgulho e
falando: “essa é minha caçula, Aninha”. Era um sem fim de pessoas que vinham cumprimentá-lo.
Depois me levou para almoçar no “Grego”. Um dos poucos restaurantes de Goiânia
à época, onde o prato principal era frango assado. Na sequência comemos pudim
no carrinho da esquina da rua quatro com a Anhanguera. O melhor: fomos a uma
loja comprar minha boneca Susi, a “Barbie” do meu tempo.
São poucas
as lembranças que tenho e rezo todas as noites, pedindo a Deus que me permita encontra-lo
ao menos nos sonhos, mas ele nunca aparece. De toda forma, sinto a presença
dele de uma maneira que não saberia explicar. Pode ser delírio, mas eu acredito
que ele está de olho e que se não mudou o rumo de algumas escolhas erradas é
porque sempre defendeu o livre arbítrio.
Olha pai,
depois que você se foi eu fiquei um bocado perdida. Meus irmãos, bem mais
velhos, não assumiram o seu papel. Na verdade, eles passaram um bom tempo me
ignorando. Eu diria que, em alguns momentos, foram até cruéis. Mas quer saber?
O tempo me ensinou a entender que eles também ficaram um tanto perdidos depois
que você partiu. E convenhamos: eles estavam começando novas etapas da vida e
eu era apenas uma pirralha com a qual eles não tinham afinidade. Era a
caçula, a garota no meio de um universo masculina. Uma garota, e garotas são garotas.
Roberval,
que também foi embora e deve andar contigo por ai, me ensinou que os
“brutos também amam”. À sua maneira, ele tinha um jeito peculiar de afeto.
Antes de ir embora até disse que me amava e me chamou de Aninha.
Brasil passou tempo demais se levando a sério. Mas hoje ele é como me lembro de você, pai. Aquele que perde o amigo, mas não perde a piada. Nas suas constantes críticas eu sou capaz de ver um homem que cuida e que ama, embora não verbalize os sentimentos.
Mas quer
saber, pai? Minha mãe fez direitinho o seu papel. Ela foi incansável na tarefa
de fazer de mim, uma mulher de valor. Se eu não atingi o nível máster a culpa é
minha, sempre cheia de perguntas, de sensibilidades, de mulherzinha, papel que
ela nunca desempenhou. Ela é prática. Ela não amolece nem na hora do carinho.
Suas mãos são pesadas e ela fala “eu te amo”, ao tempo em que te enquadra e te
empurra e diz: “você não vai fraquejar”. Ela é do tipo que segura forte, que
está sempre lembrando as facilidades que tive, enquanto ela precisou ralar
tanto. Mas é a primeira a me socorrer quando preciso. Além de mãe e pai,
construímos uma relação forte de amigas, de companheiras e a distância física nunca
impediu nossa cumplicidade.
Eu não tenho
uma foto sua nesse momento. Sei que era baixinho, tinha uma pele alva, pés
gordinhos como os meus e uma risada sapeca, acompanhada de olhos apertadinhos.
É, pai, nunca
vou saber se fui aprovada como filha, mas você, onde quer que esteja, pode
ficar certo, foi um pai nota mil.
Não sei como
funcionam as coisas por ai, na sua dimensão, mas tenha certeza que na minha
secreta comemoração, seu dia dos pais terá prosa e purpurina, terá um coração
batendo forte por ti e o respeito e admiração sem fim.
Te amo, pai.
Sempre te amarei. Vê se hoje me dá um abraço apertado e sussurra no meu
ouvido: “Aninha”.