quinta-feira, 8 de julho de 2010

"O que você quer ser quando crescer"?


Ontem à noite, Helvécio, preocupado em oferecer um bom filme, me presenteou com uma das histórias mais adoráveis que já tive a oportunidade de assistir: “Le Petit Nicolas”, por aqui, simplesmente “Nicolau”.

Na primeira cena, somos apresentados à personagem central que, numa sala de aula da década de sessenta, se vê diante do dilema de escrever uma redação cujo título é: “o que você quer ser quando crescer”? Para ele, uma criança, provavelmente entre seis e oito anos, essa é uma questão complexa. De acordo com sua avaliação, ele não quer ser nada além daquilo que efetivamente é: uma criança feliz, que recebe atenção dos pais, sobretudo da mãe, tem ótimos amigos e não almeja muito mais que isso.

O filme não poderia ter acontecido num momento mais emblemático. Ontem, eu decidi sair um pouco de casa – usando uma licença poética – para ser feliz. Como tenho estado muito reclusa, decidi que queria ir ao shopping passear um pouco.

Antes, tomei café com minha amiga Solange, comemos torta e falamos rapidamente da vida. Depois, me perdi pelas vitrines do Brasília, comprei DVDs promocionais nas Lojas Americanas (evidente, títulos de ótimos filmes que já assisti), um novo livro para as férias, um presente de aniversário para Helvécio e algumas besteiras para mim. Tomei sorvete de menta com chocolate, sentada calmamente numa poltrona, me sentindo no Freddo, de Buenos Aires, aonde aprendi a amar esse sabor.

Quando estava muito confortável no meu reino de felicidade, fui convocada a voltar para o planeta realidade. Num telefonema, minha coordenadora informava que meu desligamento do IESB havia sido confirmado e que deveria ir até lá para assinar os documentos. Embora essa não tenha sido uma surpresa – como a que surpreendeu a vida de Nicolau – de alguma forma fui intimada a também pensar: “o que quero ser quando crescer”?

Em 2004, eu me encontrei com a docência. Foi como, se súbito, com mais de quarenta anos, tivesse achado, finalmente, meu lugar no mundo. Não tive dúvidas de que era aquilo que sempre quisera fazer. Não houve sofrimento: abri mão de um trabalho seguro, de uma boa remuneração, de um nome relativamente estabelecido no mercado, para me aventurar em algo completamente novo. Com baixa remuneração, mas com a possibilidade de aprender muito, de conhecer novas pessoas, de começar a escrever uma nova página.

Nesses últimos anos, passaram por mim pessoas muito queridas. Penso ter feito diferença na vida de algumas. Recebi homenagens, me diverti, fiz novos “amigos para sempre” e enfrentei o desafio de me reinventar. Quando você ensina, a primeira coisa que faz é se expor loucamente. No modelo de ensino que temos, cabe ao professor a posição de comando. Você precisa estar à frente de um grupo de pessoas, demonstrar conhecimento, estudar e procurar não ser surpreendida por uma pergunta que não seja capaz de responder. Isso te faz vigilante. É uma obrigação estar sempre um passo à frente e nunca perder o rebolado quando alguém apresenta um assunto, sobre o qual nunca havia parado prá pensar.

De uns tempos prá cá, fazer isso, deixou de ter o encanto dos primeiros momentos. A instituição mudou, os melhores amigos se foram, mas a convicção de que ensinar era o meu grande barato permaneceu. Ocorre que a paisagem foi ficando um tanto "cinza para o meu rosa choque" (recorrendo a uma cena do passado). Sofri com crises pontuais, depois fui derrubada por outra, muito maior e agora me dei conta de que é chegado o momento de me reinventar novamente. De parar um pouco para avaliar, mais uma vez, “o que quero ser quando crescer”?

A primeira coisa que sei é que preciso ter saúde. Ela foi negligenciada pela prática comum que tenho de me boicotar. Ah! Não me pergunte os motivos que me levam a fazer isso, pois estou, de fato, tentando encontrar algumas respostas. A verdade, é que dessa vez, entendi que preciso recolocar minha vida em perspectiva. Reconduzir-me para o terreno da precedência e isso implica "me" estabelecer como prioridade.

É claro que sai do IESB coberta de lágrimas, mas a exemplo de Nicolau, foram os amigos que me acolheram e me ampararam com palavras de apoio e de crédito nas promessas de futuro. Pela primeira vez, profissionalmente falando, não tenho um plano “B”. Ao final do filme, “o pequeno Nicolau” descobre sua vocação: “fazer as pessoas rirem”. No meu caso, tenho ainda o desafio de descobrir, mas como diz o velho ditado: “nenhum caminho começa antes que se dê o primeiro passo”. Já estou com o pé na estrada. E acredito que será rumo a uma nova e promissora jornada.

Oxalá! Todos os anjos digam: "amém"!

Um comentário:

Solange disse...

Amiga,

Tão logo me desvencilhei das primeiras rotinas obrigatórias da minha manhã no escritório corri para ler seu blog. Eu tinha certeza que você escreveria.
Já te falei tudo que penso sobre essa decisão e tudo que desejo pra você daqui pra frente, portanto....Que os anjos digam AMÉM!!!
Tudo vai dar certo.
Beijos