terça-feira, 25 de novembro de 2008

O Marketing e a Filantropia


Há milhões de razões para perder a fé na humanidade. Como seguidora de Pollyanna, a menina sempre feliz, continuo acreditando que tudo vai dar certo, que as pessoas um dia serão boas e que o bem triunfará.

Surpreende-me, cada vez mais, como as práticas para arrancar qualquer dinheiro da gente, vêm sendo aperfeiçoadas pelos “pedintes”.

É impossível você estacionar um carro sem ter alguém que apareça do nada para te ensinar a manobrar o carro e lançar o clássico: “pode olhar, tia”? Há variações. A abordagem pode ser: “pode olhar, dona? Ou...”pode olhar, moça”? Ou pode ser um plus do tipo: “pode olhar, doutora”? A questão é: sempre haverá alguém de qualquer idade ou sexo que quer olhar o seu carro, mesmo que você esteja estacionando em Marte.

Eu defendo a inclusão social. Eu estou do lado daqueles que acham que é preciso distribuir renda, mas caramba! Se você for atender a todos os “pode olhar” e demais pedidos aos quais fica exposta cada vez que anda pela rua ou que para num sinal, pode apostar: logo, logo estará lá, demarcando o seu território e tentando ganhar o seu.

Assim como as práticas de marketing foram se sofisticando para atender uma clientela cada vez mais seletiva e uma concorrência cada vez mais selvagem, no quesito “esmola” (esse termo é muito pesado, eu sei) as abordagens também evoluíram.

Explico. As pessoas agora têm uma história para te envolver emocionalmente. Vez ou outra sou abordada por alguém cuja mãe está no hospital. Por outro que foi roubado e não tem como voltar para casa. Por aquele que a irmã morreu e precisa de uma “urna” (não quero pronunciar aquela palavra que me dá arrepios) para ser sepultada. Há os que apelam pela arte. “Estamos montando um grupo de teatro e precisamos arrecadar dinheiro para o cenário e figurino”... Ou o clássico: “Eu poderia estar roubando, eu poderia estar matando...” Dia desses fui surpreendida por uma situação curiosa.

Estava no meu carro aguardando num Drive Thru quando um garoto de 10/12 anos se aproximou. “Eu poderia falar com a senhora”? “Sim”, eu respondi. Então ele sacou da mochila umas toalhinhas e mandou o seguinte discurso: “A senhora poderia me comprar essas toalhinhas, eu moro ...”sei lá onde” e o dono da casa disse para a minha mãe que se ela não pagar o aluguel até hoje a noite (já era mais de 21h00) ele vai colocar nóis na rua” (sic). Enfim, saquei uma grana entreguei a ele cheia de generosidade e disse: “não quero a toalha, pode ficar com o dinheiro”. Ele disse: “obrigado” e saiu. Um segundo depois ouvi um som de celular. Era o dele. Sacou do bolso um Motorola V3 e saiu falando como um executivo.

Moral da História: quer inclusão tecnológica? Vai vender toalhinhas. O negócio tá bombando.

Férias!


Essa imagem reflete bem o meu ideal de férias no momento. Na mesinha estariam meus livros de cabeceira e o Drexler tocaria todo o tempo para embalar meus dias e noites.


Que assim seja. Amém.
Salvapantallas

domingo, 23 de novembro de 2008

"My Name is Bond. James Bond".

Falar sobre o passado ajuda a compreender algumas situações do presente – sim, é um chavão – mas é também um processo doloroso, já que muitas vezes feridas que estavam cicatrizadas voltam a sangrar.

A retrospectiva que promovi sobre minha vida e, principalmente sobre os amigos de cada período, deixou-me melancólica. Entretanto, o que mais doeu foi falar do meu pai, mesmo que brevemente, pois a falta dele é uma ferida que nunca vai sarar.

Mesmo acreditando piamente nos versos do Drexler...

“Y aunque parezca mentira
tu corazón va a sanar
y va a volver a quebrase
mientras lê toque pulsar...
y volverás a esperanzarte
y luego a desesperar
y cuando menos lo esperes
tu corazón va a sanar
va a sanar
va a sanar”....

Enfim, tomei a decisão de pausar o tema “páginas da vida” para tratar de outros mais amenos. Não quero cansar minha audiência. Afinal, ela é composta de pouquíssimos, mas preciosos seguidores, que já estão às voltas com seus próprios dilemas.

O tema mais ameno que me ocorre no momento é cinema. Mas não esperem ler aqui uma crônica erudita. Para o lamento de alguns sou uma voraz consumidora de blockbusters. Não que eu não seja atraída pelos chamados “cults”, aqueles que recebem várias estrelas dos críticos, embora nem sempre lotem uma sala de cinema.

Eu acredito ter um bom gosto musical. Eu acho até que sou leitora de bons livros. Mas quando o assunto é cinema, bem, nesse caso não sou exatamente um exemplo a seguir.

Pode apostar que eu serei sempre a primeira da fila nas estréias de filmes tipo: “Missão Impossível”, a trilogia “Bourne” (eu gostaria que fizessem mais meia dúzia de seqüências), "Duro de Matar", e claro: “007”.

Pensem numa pessoa que fica frenética, que come um saco de pipoca sem perceber e que nem pisca? Sou eu. Assisti duas vezes a “Quantum of Solace” o último lançamento do único e verdadeiro agente de “sua majestade”. Bond. James Bond.
Não acalento o sonho de ser uma "Bond Girl". Eu prefiro o papel de "M". A chefe.

Quando as pessoas me confrontam: “mas esses filmes não têm história”! Eu de pronto respondo: “quem precisa de história quando o único objetivo é ver o inacreditável Daniel Craig arrasando tudo: carros, prédios, vidros e deixando miseravelmente no chão todos os seus antagonistas”? Sem contar que não importa o tamanho do estrago, ele vai estar sempre com o cabelo com cada fio no lugar e o olhar terá sempre o cinismo na medida.

Eu também não suporto quando as pessoas vêm criticar filmes de ação, com o argumento de que neles há muita “mentira”. Faça-me o favor. Quer cinema verdade, assista documentário.

Para mim o cinema tem função de circo, de ópio. Eu gosto de pensar que terei 120 minutos de pura fantasia e delírio. Eu gosto de sangue, de explosões, de perseguições alucinadas e até de violência, mas desde que fique muito claro que é ficção. Sou uma fã inveterada de filmes passados em tribunais e as tramas que envolvem a Máfia. Se eu fosse artista e me perguntassem – como fazem em muitas entrevistas – “qual seu filme preferido”? Não titubearia: A trilogia de “O Poderoso Chefão”, que aliás é também a preferência do mais novo pop star da política “Barack Obama”.

Antes que você pense que sou uma completa alienada, pode acreditar: não dedico meu tempo apenas às bobagens de Hollywood. Sei apreciar uma boa história, sei valorizar o cinema autoral, os filmes de arte e aqueles que impõem a realidade e reflexão. Mas por favor, não me peçam para gostar de um filme só porque ele foi guiado pelo diretor do momento. Aqueles filmes aos quais os críticos teimam em atribuir toda uma constelação, mas que não passam de uma leitura tão pessoal, que apenas o diretor é capaz de decifrar o que está propondo. Muitas vezes nem sabem. Em “Magnólia”, quando perguntaram ao diretor Paul Thomas Anderson qual o significado da chuva de sapos, ele disse que não havia nenhuma razão especial, ou seja, não era uma analogia, nem tão pouco um recurso estético.

Por exemplo, eu acho que Robert Altman foi um grande diretor. Gosto, particularmente, de Prêt-à-porter, Short Cuts e Gosford Park. Mas alguém poderia me explicar o que significa aquela bizarrice de “Dr. T e as Mulheres”?

Tenho um amigo que é crítico e estudioso de cinema e que teria uma síncope se lesse o que vou dizer, mas eu acho Glauber Rocha um chato.

Sou louca por histórias aparentemente despretensiosas como “Vick Cristina Barcelona”, aliás, como sou fã de quase tudo que Woody Allen fez, principalmente de “Manhatan”. Bato continência para romances como“Antes do Amanhecer” e sua seqüência, “Antes do Por do Sol” e claro, também já vi uma dezena de vezes Julia Roberts bancar a Cinderela contemporânea em “Uma Linda Mulher”. Não resisto ao charme de Hugh Grant em “Nothing Hill” e em “Simplesmente Amor”. Estão na minha lista um filme francês que poucos viram chamado “O Oitavo Dia” e também “O Corte”, de Costa Gavras (e olha que em priscas eras “Z”, do mesmo diretor era o meu filme de cabeceira). Se fizermos uma lista dos filmes da minha vida lá vão estar os argentinos “Valentin” , "Nove Rainhas" e “O Filho da Noiva”. E nã posso esquecer "El Baño del Papa". (vamos prestigiar os uruguaios).

Mas podem estar certos de que vocês não me encontrarão em sessões de filmes que contam odisséias espaciais. Detesto. Mesmo que estejamos falando de “2001”. Não me convidem também para “filmes de guerra”. As exceções são “Círculo de Fogo” e “O Resgate do Soldado Ryan”.

Minha deformação não termina ai. Eu sou daquelas que consomem as séries americanas como LOST e HEROES e que assiste a uma infinidade de episódios repetidos de LAW & ORDER, sempre como se fosse pela primeira vez. Ultimamente minha diversão preferida é assistir a filmes que foram sucesso 10, 15 até 20 anos atrás, e são as principais atrações do AXN ou Universal. Provavelmente eu me inclua no target dos sonhos desses canais. E que fique registrado: "Face Of", de Jonh Woo. "Pulp Fiction" e "Kill Bill", de Quentin Tarantino. "Era uma Vez na América", Sérgio Leone, "Casino" do Scorcese e... esse ranking não teria fim.

É isso. As luzes já vão se apagar. Agarrem sua pipoca, não se esqueçam de desligar pagers e celulares e boa diversão.
"Quantum Of Solace"

domingo, 16 de novembro de 2008

“Tell me once again”




No meu tempo a escola era dividida da seguinte maneira: fazíamos o primário, depois o ginásio e na seqüência o colegial. Trazendo para os nossos dias, por volta de 10 anos ingressei na quinta série do ensino fundamental. Estudava perto de casa, na Escola Técnica de Comércio de Campinas, que chamávamos carinhosamente de "escolinha". A diretora, professoraVandy, foi a primeira pessoa que conheci que tinha ido ao Japão.

Nessa fase da vida eu desenvolvi a habilidade de ser amiga dos meninos. Era mais divertido, já que eles não viviam em disputas, não havia fofoca e tinham sempre ótimas piadas para contar. Lembro-me particularmente de três amigos: Cláudio Murilo, David Rios Pedroso e Luiz Cláudio. Estávamos sempre juntos. Eu e Claudinho então, éramos inseparáveis. Ele era gordinho e sabia matemática. Isso garantia um ótimo intercâmbio entre nós, já que eu era boa em Português e História. Eles iam com freqüência estudar na minha casa. Lá, fazíamos uma receita exótica: Bolo de Coca-Cola. Acreditem: era muito bom. David era um menino rico, e sempre reclamava que tinha de bater as claras até deixá-las em ponto de neve. "poxa! na minha casa tem batedeira, é muito mais fácil". Mas na minha não podíamos ter esse luxo ainda.

Tinha outros amigos: Breno Silveira, um garoto lindo de olhos azuis. Depois vieram a Lia Mara, Beto, Cida e Raquel. Estabeleci grande afinidade com a Lia. Foi com ela que pela primeira vez na vida fui a um clube, uma experiência tão maravilhosa que claro, peguei insolação.

Vivíamos juntas. Ela era mais ousada, tinha roupas bacanas e lembro que sempre me emprestava um vestido vermelho de malha que me caia bem. Na casa dela fazíamos coquetéis de pêssego com cidra e ficávamos leves... De vez em quando a gente brigava, porque ela era ciumenta e possessiva.

O Beto era um cara divertido, um pouco mais velho, que vivia imitando o jeito que eu arrumava meu cabelo. Como era muito curto eu tinha mania de ficar passando a mão e tentando mantê-lo sob controle. Chamava a Lia de “Luizão Pereira”, nome de um jogador de futebol da época, porque ela pisava prá dentro. A melhor parte de conhecer o Beto foi quando sua prima, Cida, Iracema Aparecida, veio estudar com a gente. Era fanfarrona e minha mãe a chamava de “bandoleira”. Estar com ela era sinal de boas risadas. Tinha uma descontração do interior e vinha de uma família muito agradável. Eu gostava muito de seus irmãos e, principalmente de seu pai. Seu Hélio era farmacêutico e um ótimo piadista, além de ser muito carinhoso conosco. Tinha os cabelos muito brancos e era um homem culto. Raquel era irmã do Beto e sempre foi uma pessoa difícil de lidar.

Nesse tempo minhas férias tinham destino certo: Uruaçu. Cidade do meio norte de Goiás. Lá morava minha tia Deolvira e minhas primas: Neide, Zezé, Mônica e Márcia, que nessa ocasião, não estou certa se já tivesse nascido. Minha afinidade era com a Zezé, que era um ano mais velha e com quem tinha grande semelhança física. As idas a Uruaçu trouxeram novas amizades. Uma delas, Gildecy, era muito querida. Seu pai tinha uma loja e ela vivia nos presenteando com cortes de tecido. Ela era divertida, não era bonita, tinha um jeito meio apatetado e padecia de um problema complicado. Sofria de incontinência urinária. Não importava o lugar, ela sempre fazia xixi nas calças. Quase sempre depois de uma crise de risos, e nessa época tudo era motivo para gargalhar.

Nosso programa favorito na cidade era ir ao cinema, tomar sorvete no bar do Anacleto e sentar pelas calçadas em rodas para conversar e flertar. Naquele tempo, começara o interesse pelos meninos. Havia também as festinhas onde dançávamos, tinham as idas ao Rio para tomar banho e as aventuras a bordo de uma caminhonete C10, do Carlos Alberto, que namorava minha prima Neide, um cara hiperativo, divertido e maluco. Andava veloz, fazia o que chamávamos “cavalo de pau”, curvas perigosas cantando pneus e claro, a gente adorava. Embora minha tia não visse a menor graça. Foi com ele que dancei “junto” pela primeira vez. Aliás, nesse mesmo dia estreei meu primeiro sutiã. A música era um clássico romântico da época: “Tell me once again”.

Menos românticas eram as festas que fazíamos de forma improvisada e que compreendiam a seguinte estratégia: os meninos pulavam o muro, invadiam o quintal de alguém, roubavam uma galinha e as meninas faziam uma “galinhada”. Simples assim. Divertido assim.

O primeiro flerte foi com um cara chamado “Toninho”, um quase negro de pernas muito bonitas. Quando minha “vó Anjinha” soube ficou muito triste. Ela, que tinha mais que o pé na África não gostava de negros. E nós, suas netas, parecíamos naquela época bem inclinadas a promover a mistura de raças.

Nas férias, algumas vezes fugia do circuito Uruaçu e ia para Caldas Novas. Eu e minha prima Zezé. Em Marzagão, lá pertinho, ficava outra prima, Maria Ruth. Ela era muito exuberante. Tinha cabelos pretos compridos, um corpo escultural, mas era bem caipira. Achava-me esnobe porque ao contrário dela e suas amigas que devoravam revistas de fotonovela, eu gostava de outro tipo de literatura. Aliás, numa dessas férias estava lendo “O Conde de Monte Cristo”. Hoje penso que isso podia mesmo ser uma bestice.

Em Caldas tinhamos - Zezé e eu - contato com meninos cujas famílias do interior de São Paulo, gostavam de veranear por lá. Uma coisa bizarra, considerando que calor e água quente parecem uma combinação fora de propósito. Lembro-me de um garoto em particular. Walter Borini Matez, nunca esqueci o nome porque para mim, parecia nome de príncipe. Ele era loirinho, de olhos verdes e morava em Mogi das Cruzes. Os amigos o chamavam Waltinho e eu acabei por apelidá-lo de Tim. Foi com ele que troquei o beijo mais inacreditável da minha vida. Nada de pegação, um beijo puro, mas que durou um tempo enorme. Era como se a gente tivesse entrado numa outra dimensão de tempo e espaço. Acho que o beijo foi bom, porque durante anos trocamos cartas e mandamos fotos um para o outro. Até que um dia, bem, um dia a gente se perdeu.

A adolescência é uma fase demasiado longa. Levou um tempo enorme para ter quinze anos e depois, uma eternidade para chegar aos dezoito. Mas entre uma idade e outra, muita água ainda ia rolar.

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Linha do Tempo





Eu não me lembro muito da minha infância. Nasci em Araguari, Minas Gerais, onde vivi pouco. Logo em seguida, minha família foi para Marzagão, lugar que em Goiás chamamos de “currutela”. Para que você possa localizá-la no mapa, fica a menos de trinta quilômetros de Caldas Novas, a conhecida cidade hidrotermal.

Dos tempos de Marzagão lembro que morava numa casa com um grande quintal, a cozinha era de chão batido e o local preferido da minha mãe. Sua presença lá era garantia de variedade de biscoitos e doces.

Morávamos de frente à casa de um grande amigo de meu pai: “tio Joaquinzinho”, dono da farmácia, homem de cultura e de muitos filhos. Uma porção de crianças de muitas idades. Dava-me muito com uma de suas filhas: Leda. Uma de nossas diversões preferidas era tomar Sonrisal. Sim, o antiácido efervescente. Era uma delícia! E claro, implicava em um ato de delinqüência, já que ela “subtraia” da farmácia os envelopes para que pudéssemos saboreá-los às escondidas.

Fomos morar em Goiânia quando eu tinha perto de cinco, seis anos. Até que meu pai comprasse nossa casa, ficamos num local pequeno no subúrbio. Dessa época lembro-me de ir muito à casa da Tia Rita, prima da minha mãe. Sua filha Leda namorava meu irmão Brasil. Do lado da casa da Tia Rita ficava a casa da Tia Mariinha, e com ela morava a mãe a quem chamávamos “Tia Chica”. Uma senhora de quem eu tinha muito medo. Devia sofrer o que hoje chamamos “depressão”. Queixava-se sistematicamente de estar com um “abafamento” e levava à mão ao peito para indicar onde o mal lhe consumia. Quando ficava brava gritava: “ô desgraça pelada”. Quando isso acontecia, todas as crianças eram retiradas do lugar, pois para a época, esse era um xingamento e tanto.

Amigos? Não, não lembro de tê-los nesse tempo. Sei que foi nessa época que fui pela primeira vez ao cinema. O filme? “A Paixão de Cristo”, passado em dois atos, como no teatro. Quando as luzes foram acesas eu estava banhada em lágrimas. Era como se tivesse, por alguns minutos, sofrido os mesmos percalços daquele Jesus vitimizado. Desde então, sempre foi assim. Basta que as luzes se apaguem para que eu me sinta parte da história que será contada na tela.

Por volta dos sete anos fui estudar no Grupo Escolar São Judas Tadeu, ou era São Domingos. Enfim... Lá vieram os primeiros amigos. Uma delas se chamava Shirley, mas eu a chamava carinhosamente Rosemary e depois Rose. Era uma loirinha muito magra, que tinha uma voz esganiçada, igual a de uma personagem de desenho animado, que era telefonista e que repetia à exaustão: “aqui fala Rosemary, da delegacia de polícia”. O irmão Ricardo, também estudava conosco. Os país eram muito conservadores e eu sempre achei que ela era muito diferente de todos daquela casa. Fisicamente, eu digo. Eram todos claros, mas eram de baixa estatura, de rosto redondo, enquanto a Rose, era mais alta, tinha um rosto fino e era muito magra. Não há de ver que ela era adotada? Mas essa é outra história.

Houve uma fase bastante triste nessa época. Meu pai, que era fiscal de tributos, foi transferido para uma cidade chamada Turvânia e minha mãe o acompanhou. Como era período escolar tive que ser apartada deles e ficar morando com meu irmão e minha cunhada, recém casados. Nas férias, que naquele tempo duravam muito, eu experimentei as amizades do interior. Era vista como uma garota extravagante, da cidade grande, que usava roupas curtas, ao contrário das outras meninas que se vestiam de forma mais contida. Em especial as nossas vizinhas, que tinham cabelos enormes e usavam saias até o joelho porque eram crentes. E olha, naquele tempo os crentes eram minoria.

Aqueles foram meses curiosos. Ganhei a rifa de um rádio, cortei o pé em arame farpado numa fazenda, ao subir num pé de manga e fui surpreendida certo dia pelas vizinhas gritando: “Mãe! Corre, que a Hosana tá lançando! Hosana tá lançando!” Corri porque não conseguia imaginar o que poderia significar “lançando”. Ao chegar na casa da vizinha, descobri que Hosana estava simplesmente vomitando. Acho que foi ai que entendi que vivia num país que falava muitas línguas.

Desses tempos lembro também que sofria profundamente toda vez que tinha que cortar o cabelo. Como eram encaracolados, minha mãe me fazia usar um tipo “Joãozinho”. Lembro que voltava e chorava horas de raiva da minha aparência de menino. Lembro também que é dessa época a mania de falar sozinha. Ou com personagens imaginários. Passava horas no quintal de casa construindo histórias e imaginando outras vidas. Certo dia andava pela rua numa prosa boa comigo mesma. De repente alguns meninos começaram a rir e comentar: "Ela tá falando sozinha". Para despistar eu comecei a cantarolar e eles de pronto rechaçaram: "ihhh! agora ela tá tentando disfarçar". Foi a suprema humilhação!

O sentimento mais forte desse tempo era a relação com meu pai. Ele tinha um fusca. Acho que era verde. Tratava-me com um amor que era quase devoção. Chamava-me de “Aninha” e dizia que eu ia casar cedo. Tinhamos o hábito de comer um pudim vendido na esquina da rua quatro, no centro da cidade, e de eventualmente comer frango assado no restaurante do "grego".

Tinha apenas nove anos quando ele se foi. Eu assisti seu último suspiro e me lembro cada detalhe daquela madrugada quando meu irmão me acordou e disse que precisávamos ir ao hospital. Depois, aquele dia interminável para velá-lo. Metade dele eu passei sentada no alpendre conversando com a melhor amiga daquele momento: Soraya. Neta da nossa vizinha, dona Tilde. Meu pai morreu no terceiro dia de janeiro de 1970.

Eu ainda não sabia, mas minha vida nunca mais seria a mesma. Acompanhei minha mãe no seu luto, para uma temporada na fazenda do meu irmão. Lembro de andar pelo mato e conversar muito com a minha solidão. Nesse período, experimentei uma amizade que me acompanharia por toda a vida: os livros. Minha cunhada era professora do núcleo rural e tinha uma pequena estante recheada de clássicos infantis.

Quando retornei para o período escolar tinha um monte de amigos me esperando e uma nova vida para viver. É dela que vamos falar no próximo encontro.

"Quem tem amigos nunca está só"! Será?


Há duas semanas recebi um recado no Orkut que dizia mais ou menos assim: “Se você foi minha colega no Colégio Objetivo por volta de 1978, faça contato”. A principio não reconheci o nome, mas bastou acessar o perfil e confirmar que de fato nos conhecíamos. Mais que isso. Fomos grandes amigos por volta dos nossos 17, 18 anos. Essa pessoa se chama Luis Arthur e mesmo muito jovem tinha os cabelos grisalhos. Sempre gostou de literatura e, portanto, não é de se espantar que hoje seja professor de ...literatura. Morávamos próximos e íamos juntos para a escola. Seu pai era um radialista muito festejado em Goiânia, mas ele era um menino razoavelmente tímido.

Sempre que estávamos respondendo questões de múltipla escolha ele me dizia: “a resposta certa é a letra “C” de Capitu. Ele me dera esse apelido, pois dizia que eu era como a personagem de Machado de Assis, em Dom Casmurro, “com seus olhos profundos e inexplicáveis...olhos de cigana oblíqua e dissimulada". Eu me sentia envaidecida com a comparação, porque esse é um dos livros que mais gosto. E cá para nós, com 17 anos, acho que tinha mesmo um jeito dissimulado.

Alguns contatos depois, esse meu amigo me lembrou um episódio marcante da nossa trajetória. Assim que fizemos 18 anos – aliás, nascemos no mesmo dia e ano: primeiro de agosto de 1960, fomos fazer nosso título de eleitor. Uma situação completamente bizarra, porque passamos das sete da manhã às seis da tarde na fila. Uma coisa inacreditável: a fila e nosso entusiasmo pela democracia.

Esse reencontro, ainda que virtual, me fez refletir sobre as amizades e como elas são importantes na nossa vida. De repente comecei a revisitar o passado e a lembrar de uma legião de amigos que foram se perdendo pelo caminho.

Amizades são como casamentos – sem o sexo, embora nos dias atuais, algumas delas possam até incluir esse diferencial – Certas amizades são tão parecidas com o casamento que estão, como os submarinos, fadadas a afundar. (Miguel Falabela é o dono dessa definição para o casamento).

Assim como no casamento, as amizades passam por aquela fase em que não conseguimos fazer nada sem a anuência do outro. Todos os programas, todas as confidências, todos os sonhos precisam ser compartilhados.

Entretanto, com o passar do tempo, também como nos casamentos, algumas vão se tornando um fardo que somos obrigados por dever de consciencia ou de conveniência, a suportar.

Há amigos que a gente leva muito tempo para gostar. Outros, chegam e rapidamente se tornam donos do nosso coração e a vida parece não fazer sentido sem eles.

Minha mãe sempre disse que eu me parecia muito com meu pai. Qualquer pessoa, em cinco minutos, se tornava meu melhor amigo. Isso implicava, claramente, abraçar todos os seus problemas, viver suas angústias, beber na mesma taça de suas alegrias e, naturalmente, levar uma rasteira lá na frente. Sim, porque algumas pessoas entendem a amizade como um contrato temporário, com data de validade condicionada a algum interesse em jogo, que pode ser de natureza emocional ou material.

Levei muito tempo e consumi muitas lágrimas até entender que as amizades tem um rito próprio e que não há garantia de longevidade. Se aquele amigo é para sempre ou não, depende de uma série de questões, evidente, todas elas muito subjetivas.

Eu aprendi – de forma dolorosa, mas exemplar – que há duas variáveis que são determinantes para medir a força de uma amizade: saúde e dinheiro. Na verdade, a ausência desses dois elementos. Amigos de toda hora, desaparecem num suspiro se você está mal ou se está falido.

E sabe, passando por essas duas situações eu aprendi a reconhecer e aceitar os limites das pessoas e sua incapacidade de lidar com o lado “down” da gente. Acima de tudo, entendi que amizades são circunstanciais. Nada mais, nada menos.

Hoje, depois de já ter sido a porta bandeira do bloco “eu quero ter um milhão de amigos”, consegui juntar pessoas que passam por várias classificações. Poucos fazem parte da minha vida de forma intensiva. Mas encontrá-las é sempre garantia de boa conversa, de boas risadas, de valiosos puxões de orelha e de algum tipo de aprendizado.

Não sei quem cunhou a frase, mas adoro usá-la: “quem tem amigos nunca está só”. E é sobre as amizades que fazem ou já fizeram diferença para mim, que pretendo escrever doravante.

Luiz Arthur provou-me que vinte e tantos anos podem separar as pessoas, mas que basta uma boa fuçada para reencontrá-las. Se ele perdeu tempo fazendo isso é porque nosso encontro lá atrás valeu!

Valeu, Luiz! Obrigada por ter despertado em mim o desejo de inventariar as perdas e ganhos. A ter vontade de explorar as commodities afetivas – se é possível trazer o jargão da economia para analisar as amizades e sua respectiva cotação.

Então tá combinado. Volte por aqui nos próximos dias que eu vou abrir o baú.

Cordiais saudações.

domingo, 9 de novembro de 2008

A Fantasia do Grande Amor: "Mentira"!



Na tentativa de ilustrar com minhas palavras a frustração sobre não ter um grande amor, esbarrei nos versos sábios de alguém muito mais qualificado que eu. Falo de Chico Buarque, aquele que torna qualquer adjetivo miseravelmente pequeno, na tentativa de descrevê-lo.

Que seus versos sejam, por alguns instantes, meus.

"Samba do Grande Amor"

Tinha cá pra mim
Que agora sim
Eu vivia enfim o grande amor
Mentira!

Me atirei assim
De trampolim
Fui até o fim um amador
Passava um verãoA água e pão
Dava o meu quinhão pro grande amor
Mentira!

Eu botava a mão
No fogo então
Com meu coração de fiador
Hoje eu tenho apenas uma pedra no meu peito
Exijo respeito, não sou mais um sonhador
Chego a mudar de calçada
Quando aparece uma flor
E dou risada do grande amor
Mentira!

Fui muito fiel
Comprei anel
Botei no papel o grande amor
Mentira!

Reservei hotel
SarapatelE lua-de-mel em Salvador
Fui rezar na SéPra São José
Que eu levava fé no grande amor
Mentira!

Fiz promessa até
Pra Oxumaré
De subir a pé o Redentor
Hoje eu tenho apenas uma pedra no meu peito
Exijo respeito, não sou mais um sonhador
Chego a mudar de calçada
Quando aparece uma flor
E dou risada do grande amor
Mentira!

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

"UM ELEFANTE INCOMODA MUITA GENTE"...


Você conhece alguém que está acima do peso e se sente feliz mesmo assim? Se conhecer, por gentileza, mande-me o e-mail, telefone, endereço, que eu quero conhecer e render homenagens.

Eu estou acima do peso. Vamos ser realistas: eu estou super, hiper, mega, advanced plus, acima do peso. De vez em quando eu até me esqueço que estou acima do peso. Já houve momentos em que até fui feliz, apesar de estar acima do peso. Mas queridos, estar acima do peso é como aquela musiquinha do elefante...incomoda muita gente. Pra ser sincera, eu sinto que meu peso incomoda mais aos outros que a mim.

Tem sempre alguém ou uma situação para deixar bem claro que estou acima do peso. Ah! Vamos deixar de eufemismos. O fato de eu estar gorda deixa metade do mundo a beira de um ataque de nervos.

Não! Eu não estou exagerando. É fato. Se eu chego numa loja dessas de grife, a vendedora se aproxima quase como se eu tivesse lepra e acha um jeito de, bem taxativa, me dizer que não trabalham com manequim acima de 40. Não importa se estou ali para comprar um presente para uma amiga magra ou se apenas quero saber o que pessoas normais estão vestindo. Não, querida, você não é bem-vinda aqui.

Eu gostaria muito que o mundo me visse como uma “madona” de Botticelli, ou com os olhos de Botero. Mas nos nossos dias, a beleza é patrimônio das anoréxicas. Quem mandou nascer no século errado?


A moda é definitivamente um território inacessivel para quem está acima do peso. As estampas das roupas para "gordinhas" parecem saidas de um circo. As gordas tem duas opções: ou vivem enlutadas com vestidos pretos, ou parecem uma alegoria do carnaval de Olinda. Não há meio termo. E quando há: prepare seu bolso, vai custar o dobro de qualquer outra confecção.

Semanas atrás, passei uns dias em João Pessoa. Uma cidadezinha linda e calma, onde há uma lei municipal que não permite que haja na orla da cidade, aquele “frejo” de barracas. Não há problemas se você levar seu guarda-sol, sua cadeira, mas ambulantes não têm permissão para isso. Como estamos no Brasil, mesmo com os rigores da lei, há aqueles que ficam por ali e discretamente abordam os turistas que só estão portando sua canga ou toalha.

Muito bem. Estava deitada na minha toalha, sentindo um tipo de relaxamento que a gente só experimenta à beira-mar, pensando como aquele momento era raro nos últimos tempos. Olhava para cima e via o azul do céu, e na minha frente o mar. De repente meu marido descobriu que havia um “alugador” de cadeiras por lá. Achou que teríamos maior conforto e que desfrutaríamos melhor aquele dia de sol se tivéssemos uma cadeira. Levantei-me do meu conforto, caminhei até o dito cujo do "alugador" e a primeira coisa que ouvi de um estranho, de uma criatura que nunca tinha cruzado o meu caminho foi: “não, ela pesa mais de cem quilos, vai quebrar minha cadeira”.

Foi como levar um murro no peito. As lágrimas jorravam sem que eu pudesse controlar. Vejam vocês, um completo estranho, sem qualquer cerimônia, sem nenhum traquejo fez com que meu lindo dia de sol se transformasse, súbito, num pesadelo. Não sei com que pernas sai dali. Era como se todas as pessoas da praia me apontassem: “vejam, ela é uma aberração”.

Tudo bem que a sua mãe diga que você precisa emagrecer. Tudo bem que ela diga que você está barriguda, tudo bem. Do alto dos seus mais de oitenta anos ela pode tudo. Você tem certeza de que ela não quis te magoar, que ela só está preocupada com a sua saúde, que ela quer o melhor para você. Tudo bem que seu irmão um dia já tenha dito que você tá parecendo uma “Kombi”. Ele não te odeia, ele não te despreza, só não sabe dizer de um jeito mais delicado que é bom você emagrecer.

Mas um estranho te desancar? Te humilhar, te reduzir a um monte de nada? Isso não! Que direito tem um cara que você nunca viu de massacrar sua auto-estima?

Não, ninguém gosta de ser gordo. Ninguém acha legal que a cada 10 minutos alguém venha te lembrar que sua barriga está subindo na mesa. Pode apostar, eu mataria para ter o corpo da Gisele Bündchen. Muito francamente, eu mataria para estar dois manequins abaixo do meu. Já seria o bastante.

Mas sabe de outra coisa, não é fácil emagrecer. Aliás, é fácil emagrecer quando você têm 20 anos. Basta dois dias de boca fechada e aquele zíper fecha que é uma beleza. Depois dos 40, você pode passar uma semana amarrada, comendo nada e bebendo coisa nenhuma. Quando subir na balança, vai ter perdido inacreditáveis, 500 gramas.

As pessoas acham que gordo é gordo porque não sabe resistir a um brigadeiro. Faz um ano que tenho feito um esforço enorme para emagrecer. Mas como diz o ditado, nada é tão ruim que não possa piorar. Diz a minha nutricionista que estresse engorda mais que uma picanha gorda e dez litros de coca-cola. O que fazer? Meu nome é estresse.

Meu endocrinologista disse que a minha disfunção de tireóide limita drasticamente o processo de emagrecimento. Eu podia ter sido acometida por um hipertiroidismo, isso me faria emagrecer, mas advinha? Eu fui desenvolver hipotiroidismo que faz você dobrar de tamanho.

Para completar eu tenho baixa função renal. Você acha que isso emagrece? Não. É um fator engordativo também.

Precisamos considerar ainda que tenho depressão e sabe do que mais, pessoas depressivas têm enormes chances de serem obesas. É mole ou quer mais?

O problema é que não posso andar com um super crachá explicando que meu excesso de peso está relacionado a todas essas situações. Eu gostaria de fazer feito aquelas mensagens de call center: “essa é uma gravação, se você quer ter informações detalhadas sobre as dificuldades que tenho para emagrecer, faça a gentileza de apertar a tecla 2.”

Bem, sou obrigada a reconhecer. Talvez eu conseguisse reduzir peso praticando uma atividade física. Quer saber: fiz uma avaliação e estava prestes a me matricular numa escola de natação quando fui surpreendida por uma hérnia de disco. Faz quase três meses que além de gorda, sou manca. Tratamento: paciência, RPG, acupuntura e resignação, porque a dor não te dá trégua. Abandone o salto alto e continue gorda. Não parece uma conspiração?

Semana passada um desconhecido me roubou uma vaga de estacionamento. Diante da minha perplexidade pela tamanha falta de educação ele não se fez de rogado: rindo da minha cara disse sem nenhum constrangimento: "Vá se lascar, sua vaca".


Hoje quando achava que todos os impropérios já haviam sido ditos, fui vitimada pelo mais cruel dos comentários. Estava debaixo de um sol de rachar, esperando um táxi de frente de um dos prédios da Câmara dos Deputados. Acreditem, do nada me veio uma senhora com uma criança no colo, uma pedinte que faz ponto por ali. Veio cheia de intimidade, me olhou e como se fosse minha amiga de infância disparou: “Nossa! Mas você tá gorda, hein? Como você engordou, menina? Deve ser por causa do calor”.

Eu não disse? Um elefante incomoda muita gente. Incomoda, incomoda, incomoda...

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

"AMIGO É COISA PRÁ SE GUARDAR"...


Eu o achei demasiado tímido e sem graça na primeira vez que o vi. Ele não denunciava, nem de longe, a exuberância dos leoninos. Foi um encontro fortuito. De fato, ele não me pareceu ninguém. Meses depois pensei tê-lo visto com uma fantasia que parecia uma imitação fajuta de Elvis Presley. Era uma festa para rememorar os anos oitenta, mas ele não era nada "disco".

Tempos depois me abordou. Veio efusivo perguntar-me: "Você é a Ana Maria"? Desde então a gente não se largou. Nosso relacionamento vicejou em um ambiente que não costuma render grandes paixões: foi a docência que nos juntou.

Não foram as afinidades acadêmicas que selaram nossa parceria. Foi nossa irreverência e a capacidade anárquica de tornar momentos enfadonhos em hilárias situações. Aprendemos a falar com o olhar. Quase sempre para expressar nosso sarcasmo e perplexidade diante de bizarrices como: “Na Ceilândia há muitos nordestinos vindos do nordeste”. E lá estavam os nossos olhos a perguntar: “Poxa! Estávamos certos de que nordestinos são aqueles vindos do... Sudeste. E como não rolar pelo chão quando ele veio contar-me que uma aluna o procurou compenetrada e perguntou: “Professor, qual a diferença entre “esteiquiholdi” e “benchmarketing”? E a outra que ao escutar dele que o trabalho que apresentara era inócuo, dedo em riste o confrontou: “o senhor me respeite”!

Tivemos bancas tensas, risíveis e até “bancas piquenique”. Afinal, ninguém é de ferro. E a gente lá, se fartando de bolachinhas, sanduíches e coca-cola para suportar.

E não há só fanfarronice na nossa relação. Já gastamos horas no Beirute trocando impressões sobre a vida, arrematando nossas incertezas com “banana split” (eu juro que só como as cerejas). Foi num desses encontros que me narrou seu momento “Rei do Gado”, quando, na marra, foi praticar comunicação com peões, nas longínquas terras do Pará. Lá, aprendeu que a família pode ser mais inóspita que a natureza. Contou-me também sobre um casamento que esteve prestes a se concretizar e de escolhas. Aquelas que fazem desabar todas as certezas que tínhamos sobre nós.

Tivemos também nossa agenda “artístico cultural”. Uma “tarde no museu” explorando as origens portuguesas e um momento arrebatador, quando, boquiabertos fomos apresentados a “crueldade” coreografada por Débora Kolker. Nessa mesma noite ouvimos inebriados a delicadeza da voz de Zizi Possi. É amigo, por conta dessa maratona, nesse dia, meu casamento quase foi para o sal!

Nossa história teve até um encontro não planejado em Floripa, quando ele me confiou uma imensa mala e com os olhos faiscantes me segredou: ali estava o resultado de sua gastança de milhões de guaranis.

Por falar em Guarani, como vou me esquecer de suas confidências sobre uma meteórica aventura em Montevidéu, marcada por sussurros de “mira, que divino”... "mira, que divino"! (e mais não posso contar).

Inesquecível, também, nosso plano de comadres, para tentar fisgar um peixão, que no fim, se revelou um bagrinho. Azar dele. Do bagrinho, claro!

No seu ombro chorei as incertezas do meu casamento, as preocupações com meus filhos e a falta de rumo profissional e ouvi dele de forma taxativa: “2008 vai ser o ano da sua vida. Haverá uma mudança de ciclo.” E alguém duvida que seu momento “pitonisa” não se confirmou?

Ele é o que podemos chamar de um amigo multifuncional. Recorro a ele sempre que as angústias de toda natureza vêm me assaltar. Nesses momentos ele saca seu manual para questões difusas (ou confusas). Já me disse sério: “Para de ser molenga”. E nos últimos tempos é também meu guru para assuntos acadêmicos. Ao discutir com ele minha insegurança e enfado em assumir uma disciplina, do alto de sua experiência me intimou: “Vai aceitar sim.” Desenhou rapidamente um plano de curso e me entregou todas as técnicas da metodologia “Finja que ensina. Eles fingem que aprendem". Dá para resistir?

Eu passaria horas enumerando suas qualidades. Seu sorriso grande, seu abraço de irmão, seu histrionismo, inteligência, perspicácia, sagacidade e claro, suas impagáveis imitações. No meu aniversário deu-me de presente uma inacreditável bolsa azul com poás. A minha “mais completa tradução”!

No último almoço descobrimos que nossas afinidades alcançam até a predileção pelos bonitões do cinema. Rimos muito tentando repartir de forma amigável: George Clooney (um clássico!), Gerard Butler (e seus músculos impecáveis), Clive Owen (não há o que comentar), a luminosidade dos olhos de Jude Law, a beleza nem sempre óbvia de Eric Bana e Russel Crowe? Como deixar de fora o gladiador? Ao final, para que a divisão fosse justa eu ponderei: “São todos seus. Eu fico com o Helvécio”! (rs) Para os amigos: tudo. É assim que deve ser.

“Mas no meio do caminho tinha uma pedra”. Ele me pregou uma peça. Depois que me tornei refém de seu amor veio me contar que vai embora. Está de malas prontas. Vai para BH. Vai viver a felicidade da “casa própria”. Vai se jogar. Brasília foi uma chuva. Foi a forma que o destino encontrou de nos juntar. Ele não cansa de fazer juras de amor eterno. Promessas de que ainda vamos nos aventurar pelas “Geraes”. O que me resta? Me conformar.

Bem, digamos que hoje ele recebeu uma punição. Eu não resisto amigo, mas 3x0, foi de delirar!

Bregamente, meu querido, segue daqui um beijo no coração!

E como diria Jorge Drexler: “Yo llevo tu sonrisa como bandera y que sea o que sea”!

domingo, 2 de novembro de 2008

ERRAMOS!


Nota do Editor

No afã de ingressar no planeta "blog" a equilibrista cometeu alguns erros. Ela jura que a culpa foi da falta de experiência e de uma maldita sinusite. Roga que os leitores acreditem que ela tem convicção de que "timing" não possui dois "mm". Acreditem também que ela respeita as concordâncias e que só num acesso de descuido escreveu "alguma coisa GUARDADAS". Ela jura que tentou editar, mas ainda não possui instrução tecnológica que permitisse descobrir que maldito botão deveria apertar.

Diante disso apresenta sinceras escusas, mas não pode afiançar que novos erros não irão se apresentar.