quarta-feira, 30 de junho de 2010

SOBRINHAZINHA...

De vez em quando venho por aqui para falar de alguém especial em minha vida. Hoje, chegou a sua vez. Não que eu não tenha tido, antes, razões para mencionar o enorme amor que sinto por ti. Acho que no quesito declaração de amor, estou em dia, pois não são raras às vezes que te escrevo apenas para dizer “te amo”. E também não posso me queixar de não ter esse amor retribuído. Na sua vida que mais parece um tsunami, sempre houve espaço para que pudéssemos celebrar a amizade que há entre nós.

Eu diria que mais que amigas, somos como irmãs. E não é a irmandade que se impõe pelo sangue, mas que se estabelece pela escolha do amor, pela afinidade e até porque não, pelas diferenças.

A primeira lembrança que tenho de ti é vermelha. Você tinha pernas e bochechas gordas e estava coberta de brotoejas. Era seu primeiro aniversário e lembro que ficamos horas enrolando pirulitos com cara de menina de “maria-chiquinha” e doces em formato de cenouras e maçãs.

Minha segunda lembrança é de uma menina que parecia tímida e que seria muito aplicada nos estudos. Depois, como minha memória não é das melhores, eu lembro de você emburrada e da famosa crise dos sapatos que você teimava em não guardar. E apesar de todas as promessas de castigo, não arredou pé.

Depois me recordo de um cabelo meio “Farrah Fawcett”, uma coisa em camadas e da sua boca que estava sempre ensaiando um bico. As outras lembranças são de histórias contadas pelas suas irmãs. Coisas de almas penadas na fazenda do “tio Zé” e outras presepadas de meninos, que eu sei, vocês aprontaram em profusão.

Lembro de levá-las ao cinema, lembro de um show do Lulu Santos em Brasília, quando vocês chegaram à adolescência, mas esse tempo, minhas lembranças alcançam vagamente. Eu também cuidava de inventar uma vida nova em uma nova cidade, e essa era uma fase em que sobrinhas não estavam muito interessadas em fazer confidências às tias.

No nascimento do Guilherme, lembro das três: Eliane, Cristina e Viviane. Vieram a Brasília com minha mãe e era uma alegria ver meu filho se tornar um pouco o brinquedo favorito de vocês. Depois, bem depois, fizemos uma viagem a Maceió e esse foi um momento de confidências mútuas. Você nunca foi dada a falar de sua vida pessoal, mas diria que chegou a esboçar dúvidas e elas me fizeram ter algumas certezas sobre seu futuro, que infelizmente vieram a se confirmar.

À minha maneira tentei um atalho, porque achava que podia fazer seu caminho seguir outra direção. Você veio a Brasília e eu apostei todas as fichas que poderia te ajudar a escrever outra história, mas houve um telefonema e você, como é seu costume, saiu de mansinho e nunca mais voltou. E nunca falou sobre isso. Demorei para entender, mas descobri que esse era seu jeito de dizer “não”.

Há muito para dizer sobre o tempo que separa essa época da que vivemos hoje. A mais importante delas, é que a despeito de todo sofrimento, de todas as mágoas, de todas as lágrimas e dúvidas e idas e voltas e medos você foi capaz de se reinventar. Quando achamos que só haveria cinza, você veio completamente rosa choque. E verdejou e floresceu. Tomou para si as rédeas da sua vida. E isso encheu a nossa vida de cores também.

Agora você tem muitos motivos para celebrar a vida. E é isso que tento fazer. Celebrar. Mesmo que não possa estar fisicamente presente, mesmo que não possa te abraçar bem forte, quero que essas palavras te façam saber que hoje, as minhas melhores vibrações são para você. Todas as orações te pertencem e ordeno que todos os anjos digam “amém” para a sua alegria, saúde, amor, harmonia e prosperidade.

Por fim, quero te dizer que tenho quatro sobrinhas, mas “sobrinhazinha”, só tenho uma. Assim como tenho certeza de que só há uma “tiazinha” na sua vida.

Feliz Aniversário! Feliz Dia! Feliz Noite! Felizes os beijos e abraços e carinhos. Feliz! Hoje, amanhã e sempre.

Com o amor da sua única e verdadeira.

Tiazinha.


PS. Eu queria como trilha sonora desse post uma música que representasse a nossa amizade, mas eu fiquei confusa. Então, escolhi Julieta Venegas.

domingo, 27 de junho de 2010

"...De enxergar um novo dia"...


Nessa semana dediquei algumas horas do meu dia para uma atividade que andava esquecida. Andei juntando uma peça aqui e outra ali, fazendo colares. Nunca tive habilidades manuais e certamente morreria de fome, se precisasse ganhar a vida com esse recurso. Mas houve um tempo em que consegui fazer peças bonitas e em alguns casos, até criativas. Depois, guardei meu arsenal de contas e linhas numa caixa e agora, achei que estava com vontade de voltar a me experimentar nessa arte.

Comecei a fazer os colares de forma intuitiva. Nunca fiz um curso. Um dia decidi que queria tentar e vi que era possível, com alguma concentração e um pouco de criatividade, fazer com que contas coloridas, grandes ou pequenas, se harmonizassem. É uma atividade prazerosa, que faz o tempo andar rápido e no final, o resultado pode surpreender. Ou não.

Enquanto procurava, primeiro organizar a profusão de peças, que estavam literalmente entocadas no armário, e depois arquitetar o desenho que queria dar aos colares, comecei a refletir que essa atividade talvez fosse uma forma de tentar dar forma a minha própria vida.

Assim como as peças, minha vida está desorganizada. Apesar de obedecer a uma rotina relativamente simples, meus dias esbarram na complexidade que é tentar encontrar uma saída, uma alternativa para o futuro. Não é fácil chegar perto dos cinqüenta anos e descobrir que é preciso fazer uma mudança de trajetória. Normalmente, esse é um momento em que as pessoas alcançaram um patamar de segurança, emocional e material. Mas para mim, esse tempo não chega exatamente nessa ordem.

Eu olho minha vida nesse momento e vejo um conjunto de peças que não conseguem se alinhar. Eu experimento juntar cores, eu tento uma solução monocromática, mas o resultado final é sempre um ponto de interrogação. Como diria um velho conhecido, não consigo encontrar a peça que falta para finalizar o quebra-cabeça.

Já convoquei ajuda especializada e há quase uma unanimidade de opiniões. Mas é difícil tomar uma decisão desse tamanho. E Nelson Rodrigues não dizia que toda unanimidade é burra? E assim, mais uma madrugada se vai. Talvez eu devesse trocar o nome desse blog para Diário da Madrugada. Não é fácil acordar todas as noites e ficar pensando o que fazer. O que deve prevalecer? Razão ou intuição?

Fico pensando no dia em que decidi vir para Brasília. Eu tinha pouco mais de vinte anos, um grande amor pelo qual achava que valia lutar e uma história profissional para escrever. Foi tão simples. Eu simplesmente juntei “meus livros e discos e nada mais” e fui. E vim. Agora, que considero fazer o caminho inverso, a bagagem é pesada demais. Não se trata apenas de juntar discos e livros. Há filhos, há um companheiro e pior, há dúvida. Esse é o pior dos fardos. E há culpa. E há medo.

sexta-feira, 25 de junho de 2010

Tiete

Os que me conhecem de perto sabem que só há uma coisa que gosto mais de comprar do que livros: sapatos. Meu gosto é eclético e só não há espaço para os livros ridículos de auto-ajuda e me desculpem os seguidores, mas no dia em que comprar um livro de Paulo Coelho, podem preparar a camisa de força.

Entre os meus escritores favoritos está um inglês chamado Nick Hornby. Ele me ganhou com um livro chamado “Alta Fidelidade”, que relatava um obstinado colecionador de rankings. Explico. O personagem tinha o hábito de fazer listas. Em especial, das melhores músicas, das melhores bancas de rock, das melhores e piores namoradas, dos foras mais ou menos bizarros. Ele tinha uma loja decadente de discos de vinil, um relacionamento complicado e enfim.... não é exatamente para contar dele que escrevo aqui. Só para ficar nesse autor, depois li o “Grande Garoto” e “Febre de Bola”. Todos, aliás, viraram filmes bem legais. Bem recentemente li seu último livro que se chama “Juliet, nua e crua”. Em suas obras há duas referências obrigatórias: música e futebol.

Ao ler “Juliet” senti uma identificação imediata com o personagem, pois na primeira parte do livro ele nos fala da obsessão de um homem por um astro do rock que se recolheu ao ostracismo quando fazia sucesso, deixando em orfandade um grupo de fãs. Esses, por sua vez, passam a se alimentar dos boatos do que teria acontecido ao ídolo e sobre os motivos que o fizeram abandonar, súbito, sua trajetória de sucesso.

Numa das ótimas passagens do livro, o personagem, que vive numa pacata cidade da Inglaterra, viaja com sua mulher para os Estados Unidos para seguir os últimos passos que esse pop star teria percorrido antes de abandonar os palcos. Esse tour, incluía, inclusive, um banheiro de um bar decadente, onde, especulava-se, teria tido uma espécie de visão e decidido deixar a glória para virar história.

Enfim, faço esse relato para contar que ao ler “Juliet”, pude perceber quanto é bizarra a obsessão de alguém quando se torna “tiete”. É como se fossemos tomados por um vírus letal, inoculado uma espécie de veneno que rapidamente se dissemina pelo sistema nervoso e nos torna reféns de patetices inacreditáveis, como ter dois ou três discos – e falo do mesmo título – por medo de que algum possa se perder ou estragar. Ver três apresentações seguidas do mesmo show, sentada na primeira fila, viajar a Montevidéu...E claro, aqueles que me conhecem de perto, sabem que me refiro a obsessão por Jorge Drexler.

E aqui, finalmente chego ao motivo desse post, que não é falar de Hornby ou de Drexler, mas contar como cheguei ao “El cuarteto de nos”. Simplesmente porque houve um tempo em que tudo que pudesse me remeter ao Drexler, era importante. O que não foi de todo mal, tendo em vista que graças a esse devaneio, tive a oportunidade de conhecer Kevin Johansen, Bajofondo e Supervielle, Fernando Cabrera e outros.

Mas voltando ao “El cuarteto”... eu os encontrei por acaso, ao ver um clipe de uma música divertidíssima, e fui surpreendida por saber que além da riqueza melódica e poética de Drexler, o Uruguai tinha um grupo de música pop, que mal comparando poderia ser colocado no nível do “Ultraje a Rigor”. Com letras irreverentes e um estilo meio Beatles ou Monkees de tocar. E sim, Vivi, eu acho que você deve experimentar, pois aquele disco que comprei por ai, não é das melhores coisas desses músicos. Portanto, atendendo seu pedido, o telegrama musical de hoje é prá você. Ou porque não dizer, “hoje a festa é sua, hoje a festa é nossa é de quem vier, quem quiser....”

Besitos.
PS - 1 A Vivi não é mais japonesa.
PS - 2 Por falar em futebol, tenho torcido loucamente pelo time do Uruguai e aquele Forlán... Deus do céu, me acuda e guarde.




quinta-feira, 24 de junho de 2010

"Telegrama Musical"


Quando trabalhei na Abril, uma de minhas atribuições era fazer assessoria de imprensa. Divulgar os produtos e iniciativas da empresa, entre elas, as revistas. Nesse trabalho tive o prazer de conhecer pessoas interessantes. Uma delas, um diretor de uma rádio da cidade, que gostava de fazer uma brincadeira com os amigos. Ligava eventualmente e deixava tocar uma música que fosse especial para essa pessoa.Ele chamava isso de "telegrama musical". No meu caso, fui brindada certa vez com a trilha de “Anônimo Veneziano”.

Essa lembrança me ocorreu porque Luiza, minha amiga querida, tem me enviado por e-mail algumas canções, com destaque para as gregas e italianas. Hoje ela me brindou com uma seleção caprichada e pediu que escolhesse a minha preferida. Entre elas, estava a estupenda e indescritível trilha do filme “Anônimo Veneziano”.

Lembro de ver esse filme na minha adolescência e de nunca ter me esquecido da música. Veneza, eu confesso, nunca foi meu sonho de consumo. Intuo que aquela profusão de águas e aqueles canais me causariam uma imediata crise alérgica. Além do que, não alimento o romântico desejo de circular a bordo de uma gôndola, mas a música, essa me encanta e arrebata. De todas as versões, seria justo escolher a trilha original, de Stelvio Cipriani, mas ainda prefiro a versão de Fausto Papetti.

Portanto, minha querida amiga, escolha feita. E se a música não embala um amor veneziano, ela torna essa madrugada insone um momento raro de beleza musical. E fechando os olhos posso facilmente me transportar para qualquer lugar. Com essa trilha sonora, qualquer paisagem vira cena de cinema.




terça-feira, 22 de junho de 2010

Para Helô!


Hoje foi um dia especial. Nos últimos meses tenho vivido quase reclusa. É o principal ônus da depressão: limitar o mundo às paredes da minha casa. É como caminhar em terreno seguro. Sem surpresas. Mas hoje sai para almoçar. Beirando os cinqüenta anos, tenho a alegria de ainda ter amigos e de poder passar com eles, momentos de descontração.

Esses, são amigos que conquistei na docência: Alceu, Daniel e Giovani. Deveriam estar por lá, a Silvia e Graça, mas elas tiveram um contratempo. O encontro foi marcado para aproveitar a presença de Giovani na cidade, já que ele nos deixou para ir morar em BH. Esse é um grupo responsável por ótimos momentos que já vivi. Eles chegaram à minha vida, quando eu pensava que não haveria novas amizades, que as mais importantes já haviam sido consolidadas. Foi bom, muito bom saber que a despeito da idade, sempre é tempo de ver novos amigos chegar.

Embora nosso encontro tenha sido uma delícia, escrevo para falar de uma amizade do passado. E ser do passado não significa que já era. Conheci essa amiga nos meus primeiros dias de Brasília. Me lembro como hoje do nosso primeiro encontro. Eu estava às voltas com um cara que hoje poderia ser classificado como um “ficante”. Saímos, fomos a um bar e sentamos numa mesa próxima de uma floreira. De repente, um carro invadiu o lugar, derrubou as mesas – melhor, esmagou as mesas – e meu amigo só teve tempo de me empurrar para o lado para que eu não fosse o próximo alvo do carro desgovernado. Resultado: uma garota tinha pego o carro do namorado e como não sabia dirigir, fez uma confusão básica de pedais: ao contrário de usar o freio, mandou ver no acelerador. Por pouco não causou uma tragédia. Eu sai arranhada, assustada e para não perder a noite, fomos a outro bar. Foi lá que conheci Heloisa. Na época, ela namorava um amigo desse meu “ficante” e tivemos uma empatia imediata.

Eu morava sozinha num pequeno apartamento na Asa Norte. Ela, numa bela casa no Lago Sul. Eu andava de ônibus. Ela dirigia o carro do pai, um Landau. Ela tentava convencer o Renato que o amor deles era prá sempre. Eu tentava salvar um amor que agonizava. E nenhuma de nós se dava conta do óbvio: antes de amar tanto aqueles homens, precisávamos gostar um pouco mais de nós.

Tivemos encontros memoráveis. Como num dia em depois de uma briga com o Renato, saimos e bebemos mais de vinte chopps. Algo impossível de imaginar nos dias de hoje. Depois, numa ressaca monstruosa, fomos ávidas procurar uma coca-cola.

Mas uma das lembranças mais divertidas que tenho dela, foi de uma viagem que fizemos de ônibus para Goiânia. No trajeto, cansadas, só queríamos dormir um pouco, mas uma criança não parava de chorar. Ela repetia, quase como um mantra, a mais escatológica das expressões: “mãe, eu “qué coco, mãe eu qué coco”. Depois de escutar essa besteira pela décima vez, Heloisa não se fez de rogada e falou bem alto: “minha senhora, dá logo coco prá ver se essa criança para de chorar”. Contando assim, parece piada, mas aconteceu. E eu nunca me esqueci.

Durante a minha gravidez, Helô foi companhia habitual. Almoçávamos juntas, íamos ao clube, e quando o Guilherme nasceu e precisou de três intervenções cirúrgicas, ela estava lá. Foi ao hospital doar sangue para o meu filho.
Quando o namoro com o Renato terminou, ela foi morar em Araraquara. Embora já fosse uma jovem mãe, peguei um ônibus e fui passar um final de semana por lá. Nunca me esqueço de chegar e encontrá-la loira. E claro, levar um susto. De repente, depois de dormir para descansar, acordei e ela já estava de novo morena. Meu olhar de surpresa foi a deixa que ela precisava para entender que tinha sido ousadia demais.

De vez em quando a gente se perdia e se encontrava, mas a distância nunca foi obstáculo para a amizade que construímos. Um dia, quando há muito não tinha notícias dela, entrei no banheiro de um restaurante. Tinham algumas mulheres conversando e ao entrar numa das cabines ouvi a sua voz. Foi uma coisa incrível ouví-la falar: “amiga na vida, eu só tive uma: a Ana.” E desandou a falar de mim de uma forma muito carinhosa. Foi emocionante. Quando ela me viu, foi surreal. Coisa de amigo. A gente chama, ele vem. Para mim aquela foi uma das mais sinceras declarações de carinho. Alguém que fala de você, sem ter a menor ideia de que você possa estar por perto e marca, para sempre, o seu coração.

Depois, a Helô casou com o Roberto. Eu fui ao casamento que foi lindo. Nos vimos uma outra vez, e perdemos contato. Anos adiante, encontrei a mãe dela e soube que ela tentava engravidar, mas sem sucesso. Conversamos por telefone e ela me disse que estava cansada, o tratamento era doloroso e os resultados não eram promissores. Falamos de adoção. E foi com o coração aos pulos, que meses mais tarde fui surpreendida por ela, emocionada, me contando que a Luiza ia chegar. Era a filha que Deus lhe mandara. Depois disso, nos perdemos de novo. Foram alguns anos sem contato.

Ano passado recebi, com surpresa, um recado pelo Orkut no qual ela nos resgatava. Soube que ficara viúva, tive notícias de seu sofrimento, e de que ela agora vivia em Santos com a sua Luiza. Trocamos fotos, relembramos nossas estórias e quis a vida que apesar dos atalhos, nossos caminhos voltassem a se cruzar. Agora, falamos regularmente por e-mail, eventualmente por telefone e já nos prometemos uma visita.

Hoje, o primeiro e-mail que li foi o dela. Nele, me conta com entusiasmo, que um amor da adolescência reapareceu e que está namorando. Fiquei profundamente feliz. Feliz, porque ela é uma mulher jovem e bonita que merece recomeçar. Feliz, porque espero que possamos sentar qualquer hora e dar risada das nossas aventuras do passado. Feliz, porque a vida tem sempre um novo capítulo, mesmo quando a gente imagina que chegou à última página.

Heloisa, nesse “Diário” tenho falado de mim e das pessoas que gosto. É justo que você esteja aqui, pois foi, é, e sempre será parte da minha história.

Um beijo, querida. Seja benvinda e que dessa vez, seja para ficar.

sábado, 19 de junho de 2010

Chá da Madrugada



A madrugada avança. E eu aqui...vivendo meu ritual de acordar e rolar pela cama. Depois, andar pela casa e ficar conversando com as coisas. Por fim, tomar um chá. Pode ser de camomila, de jasmim, alecrim, canela, cravo ou hortelã. Pode ser um mix disso tudo. Outra noite experimentei chá de alface. Sim, juram que é um santo remédio para a insônia. Para mim, não foi.

Como o poeta Álvaro de Campos..."Não durmo; não posso ler quando acordo de noite; não posso escrever quando acordo de noite; não posso pensar quando acordo de noite; meu Deus, nem posso sonhar quando acordo de noite".






sexta-feira, 18 de junho de 2010

A Morte do Escritor


..."Não me acuse o leitor de obscurantista. Tenho uma confiança danada no futuro e é para ele que as minhas mãos se estendem. Mas o passado está cheio de vozes que não se calam e ao lado da minha sombra há uma multidão infinita de quantos a justificam"...("Os Portões que dão para onde?", do livro "A Bagagem do Viajante").

O trecho acima é de José Saramago, que hoje deixou essa vida. Chorei ao ouvir a notícia. Eu sempre choro, quando alguém de tanto valor se vai. Nesse caso, com um enorme sentimento de culpa. Embora seja um escritor reconhecido e meritoriamente incensado, nunca consegui concluir um livro seu. Tentei o "Ensaio sobre a Cegueira", depois, "O Homem Duplicado", mas acho que ele estava muito além, e era demais para a minha pobreza intelectual.

Mas como ele mesmo dizia: "não haverá grandes probabilidades de nos salvarmos, se não salvarmos a inteligência. Até ao dia em que já não farão falta os intelectuais, porque todos o serão".

Que assim seja!

quinta-feira, 10 de junho de 2010

"Na alegria, na tristeza, na saúde e na doença"


Faz tempo que quero te escrever. Aliás, você deveria ter sido um dos meus primeiros registros nesse diário. Sei o quanto se ressente de já ter lido aqui, declarações de amor a amigos e parentes. Sei quantas vezes se perguntou e me perguntou por que razão nunca havia mencionado a nossa história. Eu não te escrevo para justificar. Você sabe, o sentimento tem um tempo particular e caprichoso. Acordei nessa noite fria e ao tentar fazer frente ao enorme turbilhão de pensamentos, me dei conta de que precisava levantar, mesmo estando tão quente o seu pé junto ao meu, para te escrever.

Certo dia, numa das sessões de terapia que fizemos para tentar organizar a nossa desordem emocional, fomos surpreendidos por uma pergunta. Não sei se você pensou nisso em algum momento, mas para mim esse se tornou um tema recorrente. A pergunta era: “é fácil identificar os motivos para separar vocês, mas o que os mantém juntos”?

Talvez sejamos o casal mais imperfeito que já andou por esse mundo. Costumo dizer que se eu ganhasse uma moeda de dez centavos todas as vezes que disse que queria te deixar, poderia ser uma mulher rica. Foram muitas mágoas, minhas, suas. Como na canção do Chico, “com todas as palavras feitas para sangrar, já nos cortamos”. E como nos cortamos, mas continuamos aqui. E agora, nesses dias em que me surpreendo tão frágil, percebo que você é uma parte essencial da minha vida. Responder aquela pergunta da terapia fica fácil: o que nos mantém juntos, é amor. Um amor imperfeito, um amor desconjuntado, um amor que não é como aquele que eu sempre sonhei. Aquele dos romances de Hollywood. Nosso amor não tem fundo musical, você está longe de ser um príncipe encantado, eu estou mais próxima da Fiona, de Shrek, nosso reino está em frangalhos, mas cá estamos.

Nossas cenas não acontecem em cenários idílicos. Nosso castelo é um amontoado de desordem, mas não há hora mais alegre do que aquela em que nos deitamos e você me acolhe e pacientemente, aceita que eu me enlace nas suas pernas e toque seus pés e te abrace forte, para ter certeza de que nenhum fantasma venha me surpreender. Embora, vez ou outra isso seja impossível de evitar.

Eu te agradeço por secar as minhas lágrimas, por responder mil vezes, quando eu chamo seu nome, apenas para ter a segurança de que está perto, pelas horas que você passa procurando incansável, pelo filme que poderá me distrair um pouco. Agradeço por se preocupar com os meus remédios, por sair cansado do trabalho e ir ao supermercado e apesar disso, sentar e assistir a mais uma sessão de cinema.

Sou grata pelas deliciosas horas que passamos tentando decifrar os mistérios de LOST, por ter sido um parceiro fiel nas desventuras de Michel Scofield e Lincon Burrows. Eu te agradeço por ter assistido duas sessões seguidas de “Quantum of Solace”, só para eu experimentar a adrenalina de ver Bond, James Bond, destruindo carros e despachando tiros. Sou grata por te ver enfrentando a trama batida da novela das oito, só para estar comigo.

Eu te agradeço por todos os “eu te amo” que você me disse, mesmo de forma cifrada, porque sei que são palavras que você não foi preparado para repetir. Eu te agradeço por correr para o computador para achar um livro que preciso para uma aula. Te agradeço por ter me surpreendido com os filmes: “Antes do Amanhecer” e “Antes do Por do Sol”, que vieram com um lindo cartão num dia dos namorados. Eu te agradeço por ter me oferecido como primeiro presente do dia das mães, uma máquina de lavar roupas que veio acompanhada de um ingresso para assistir um espetáculo de Denise Stoklos. Eu agradeço por ter me brindado com uma estupenda apresentação do Balé Nacional de Cuba, e por ter me permitido ver uma apresentação do Bolshoi. Não vou me esquecer daquele dia, que sem motivo aparente, você me trouxe um disco de Nana Caymmi.

Jamais me esquecerei da sua persistência, correndo por cidades satélites a procura de leite materno para nosso filho. Das situações bizarras que precisou passar por conta disso. Das suas mãos suando cada vez que o Dr. Nelson olhava com aqueles olhos de cifrão e você não se abatia indo a luta para que nosso filho pudesse viver.


Eu te agradeço por ter ficado naquela fila imensa, subornado e moça da frente, só para que eu pudesse assistir as apresentações do Drexler, no CCBB. E como posso me esquecer de ter ido ao Canecão para ver meu ídolo, graças a você? Eu te agradeço pelo aniversário surpresa, anos atrás, quando você usou sua restituição de imposto de renda para reunir meus amigos. Eu te agradeço por ter tido sempre tanta paciência quando eu fazia minhas farras do cordial, e aquelas amigas barulhentas tomavam conta da nossa casa. Agradeço pelos charutos que você saiu para comprar, porque cismei que precisava desse ritual.

Eu te agradeço por aquelas férias inesquecíveis em Maceió, João Pessoa e Natal, quando você não mediu esforços para que eu, apesar do barrigão de sete meses, pudesse me divertir. Por todos os presentes que sempre fez questão de me oferecer, mesmo aqueles que eram dois números menores que o meu. Nunca vou me esquecer das travessuras e gostosuras pagas com notas de 100 dólares, quando a gente nem imaginava que a vida ia ser tão dura.

Quem diria que íamos empurrar uma Belina velha, que recorreríamos ao “Peixe” para os dias de vacas magras. Lembra daquele crepe dividido numa lanchonete de São Paulo? E do edredon que você trouxe, quase como um pedido de casamento? Lembra da arara colorida e do brinco verde que me deu no nosso primeiro natal?

São muitas as coisas que gostaria de te dizer e isso não apaga os momentos ruins. Eles foram caudalosos também. Mas agora, que estamos caminhando para o outono de nossas vidas, do que adianta lamentar o que podia ter sido e não foi?

Obrigado por estar ao meu lado mesmo que eu seja “um time” a caminho da terceira divisão. Eu sei que os últimos dias têm sido particularmente difíceis para nós, mas oxalá, como tantas vezes, a gente consiga se reiventar e que as últimas palavras que eu escute, antes de ir embora dessa vida, seja você me chamando de flor.

Te amo! E entendo agora que o nosso encontro foi uma predestinação. Estava mesmo “escrito nas estrelas. Tava sim”.
Beijo.